Prenda de Natal
A Acácia do quintal tinha começado já a florir e como estavam lindos os seus ramos!
Os mais pequenos batiam palmas de contentes ao descobrir cada dia, na velha acácia, mais uns botõezinhos vermelhos!
- Mamã quando ela estiver toda florida será Natal e falta tão pouco tempo… que bom! O Menino Deus vai nascer outra vez para nós.
Beatriz escutava distraída as vozes dos seus filhos, preocupada em procurar, na sua pobreza material, um tesouro escondido com o qual pudesse realizar os sonhos infantis… mas não encontrava nada… tão pouca coisa havia em casa! Mas era preciso inventar, criar qualquer coisa que os satisfizesse, que os fizesse sentir como os outros meninos, os meninos ricos como o Joãozinho do prédio bonito da esquina.
-Mamã, o que nos darás neste Natal? É verdade que o Menino Jesus ainda não to disse?
Decididamente não deixavam pensar Beatriz mas ela ria-se com a alegria dos seus cinco filhos.
-Não meus queridos nada vos posso dizer… é surpresa porque, de outra forma, deixaria de ser prenda de Natal. Pronto, não falamos mais nisso e vamos arrumar a cozinha que o pai está a chegar. E todos deitam mãos à obra. Beatriz adorava quando o marido chegava a casa e era atacado pelo bando dos filhos e estendendo os braços para a mulher dizia: Cheguei ao paraíso!
Beatriz era feliz apesar das paredes nuas da sua casa, do mobiliário pobre, das dificuldades monetárias; era rica de calor humano, de compreensão e de amor.
A acácia acabou por florir toda e o Natal bateu-lhes à porta. Os pequenos cochichavam com risadas felizes. Beatriz pensava que as prendas não seriam o que desejava… havia o impossível financeiro. Rebuscou numa velha mala onde guardava coisas da sua juventude à procura do que pudesse transformar, com a sua habilidade, em prendas bonitas.
Encontrou um tecido colorido e moderno. Dali faria um boné muito simpático destes que os miúdos gostam de levar para a escola. Seria para o João Paulo que gosta sempre de parecer bem. De um seu vestido já antigo faria dois bem juvenis para as duas mais novas. Para o Luis Manuel encontrou a capa de um livro em cabedal, já usada, mas com o seu jeito para o desenho, criaria uma capa que ele iria adorar. Trabalhada ficaria como nova.
Para o mais velho é que não encontrava nada que a pudesse encantar. De repente caiu-lhe nas mãos um livro de poemas do seu tempo de estudante e não pensou mais. Seria a melhor prenda que poderia dar ao filho mais sensível que sentia já uma irresistível atracção pela poesia.
Beatriz dispôs-se então a resolver outro problema: o da ementa. Andou à procura de todas receitas mais económicas que lhe permitisse consolar a sua gente com pouca coisa. Serviu-se da sua criatividade e imaginação e de todo o amor para realizar uma ceia de Natal condigna daquilo que a sua família dela esperava.
-Mamã, fazemos também o presépio?
-Com certeza meus filhos.
E à noite, depois do jantar reuniram-se no “cantinho da mãe” como todos chamavam ao local onde Beatriz se sentava para cozer e até mesmo, quando as lides da casa o permitiam, para pensar e sonhar.
Com bocaditos de trapos e de cartão fizeram as figuras que o pai com paciência ia colando João Paulo pintava expressões faciais e que bem que elas ficavam!
Ao desenhar o rosto da Virgem, uma ruga vincou-lhe a testa e a mãe sentiu esta preocupação:
-Que há meu filho?
-Mamã, como hei-de pintar o rosto de Maria? Não o posso pôr a sorrir pois com tantas necessidades que havia na gruta como podia ela sorrir? Eu bem vejo a tua tristeza quando te pedimos pão e tu não tens para nos dar. É a mesma coisa, não é mamã?
-Sim, é a mesma coisa mas, sabes, penso que podes pôr a Virgem a sorrir porque no presépio havia o calor do grande amor entre os três.
Os dias correram e o calendário mostrou a folhinha de 24 de Dezembro, de uma manhã linda e quente com o céu muito azul e um ar perfumado. Em casa, os risos das crianças e a sua alegria faziam daquela manhã a mais sedutora de todas. Mas nem todos riam. Pedro, o filho mais velho, apresentava um rosto fechado e triste. Beatriz entendeu aquele olhar inquieto.
-Queres vir com a mãe ao quintal apanhar uns raminhos de salsa? Pronto! Era o que ele queria ouvir. Seguiu a mãe com as mãos nos bolsos, como um homem grande, com problemas profundos.
-Mamã, já tens a minha prenda de Natal? É que eu queria pedir-te uma coisa…
-Diz, meu filho, se for possível…
-Olha, não sei se conheces o Carlitos, ele é meu colega da escola. Vive só com a mãe porque o pai abandonou-os.
Beatriz entristece-se pelo drama em si e por não poder evitar ao filho os choques que a vida lhe daria.
-Eles não têm nada em casa. São muito mais pobres do que nós e falta-lhes o calor do amor que tu falavas ao João Paulo. Eles vão ter muito frio este Natal, mamã. E sabes… tive uma ideia que não sei se tu e o pai aprovarão.
-Fala meu filho, se for boa com certeza que não diremos que não.
-Eu posso convidar o Carlitos e a mãe a passarem o Natal connosco? Era esta a prenda que eu queria que me dessem.
Beatriz comovida abraçou o filho que tinha entendido bem a mensagem de amor que um Natal sempre traz.
-Sim, podes convidá-los. Ficaremos todos contentes por tê-los connosco nessa noite santa. Vai pois, a correr, dizer-lhes.
Cantando, com um sorriso a bailar-lhe nos lábios e no coração, Pedro saiu a correr de junto da mãe. Beatriz à entrada de casa acompanha-o com o olhar até o ver desaparecer na curva do caminho.
Erguendo os olhos ao céu, Beatriz agradece a Deus aquele Natal pleno de amor e de alegria que toda a sua família iria viver!
Este conto foi transportado daqui:
http://zambezianachuabo.blogspot.com/2011/12/prenda-de-natal.html, do Blog Zambeziana, da querida Graça